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'Delírio', de Roberta Sá, promete e não cumpre

Ao largo das ousadias musicais de veteranas como Gal Costa e Elza Soares, Roberta Sá está de volta ao samba em ‘Delírio’ (MP,B Discos/ Som Livre), quinto álbum da discografia inaugurada oficialmente com ‘Braseiro’, em 2005, ainda hoje o seu melhor disco. ‘Braseiro’ tinha uma leveza descompromissada que Roberta foi perdendo gradativamente ao longo da carreira. A bela potiguar foi gostando de brincar de diva da canção, posto que, naturalmente, não se ocupa apenas por vontade própria. É esta cantora dada a interpretações pretensiosas que se ouve em ‘Delírio’. Produzido com apuro por Rodrigo Campello que a acompanha desde o primeiro lançamento, o novo trabalho não alça voo. Roberta canta as dez canções do mesmo jeito cálido e afetado que (muito) pouco se assemelha ao ambiente envolvente e (quase sempre) buliçoso do samba. Seja na composição de Adriana Calcanhotto, ‘Me erra’ (2015), ou numa admirável parceria de Baden Powell (1937 – 2000) e Paulo César Pinheiro, ‘Última forma’, lançada p...

Show 'Estratosférica' traz Gal Costa em estado de graça

Gal Costa cantou (muito bem), dançou e até ensaiou uma das suas famosas corridinhas, comuns nos anos 1980, no palco do Vivo Rio, na estreia carioca do show ‘Estratosférica’, na noite de sábado, 10 de outubro de 2015. Irradiando felicidade e segurança, a cantora comemora seus 50 anos de carreira nos braços de uma nova legião de fãs, que se aproximou a partir do disco/show ‘Recanto’. Os 70 anos lembrados por ela em ‘Meu nome é Gal’, primeiro número do bis, parecem não pesar. Sem concessões ao seu passado de excelente intérprete de mestres como Ary Barroso, Dorival Caymmi e Tom Jobim, ou mesmo de alguns medalhões da MPB também associados à sua discografia, como Chico Buarque e Djavan, a baiana priorizou seu lado mais roqueiro no roteiro que inclui a inédita ‘Pelo fio’ (Marcelo Camelo), ‘Cartão postal’ (Rita Lee/ Paulo Coelho) e ‘Os alquimistas estão chegando’ (Jorge Ben Jor), entre outras surpresas. Os arranjos executados pela competente banda formada por Thomas Harres (bateria), Maurí...

Elza Soares volta a ser impactante como 'A mulher do fim do mundo'

Elza Soares traz à luz seus recantos escuros, impregnados de sangue e suor, prazeres e lágrimas no urgente ‘A mulher do fim do mundo’ (Circus/ Natura Musical ), seu 34º disco, o primeiro inteiramente de inéditas em mais de seis décadas de carreira. Conduzida pelo músico e produtor carioca residente em São Paulo, Guilherme Kastrup, a mulata desfila seu enredo entre estranhezas sonoras de uma das turmas da fervilhante cena musical paulistana contemporânea. O resultado é impactante. Linhas de baixo (Marcelo Cabral) bem marcadas, guitarras rascantes (Kiko Dinucci e Rodrigo Campos), percussão (Felipe Roseno) e bateria (Kastrup) sem enfeites formam a áspera base das faixas, algumas delas adensadas por dramáticos naipes de cordas e de metais. No entanto, é a voz solitária da mulher do fim do mundo que se ouve em ‘Coração do mar’, que traz versos de Oswald Andrade musicados por José Miguel Wisnik. Um navio “humano, quente, negreiro do mangue” que aporta na canção-título, composta por Romulo ...

Joias de Beto Guedes e Ronaldo Bastos reluzem na voz de Jussara Silveira

Jussara Silveira reuniu dez composições assinadas por Beto Guedes e Ronaldo Bastos em ‘Pedras que rolam, objetos luminosos’, disco lançado pelo selo Dubas Música, via gravadora Universal Music. Produzido por Marcelo Costa (bateria e percussão) e Sacha Amback (piano, teclados e programação), ‘Pedras que rolam, objetos luminosos’ reafirma a perenidade e a contemporaneidade dos temas escritos sob a ótica agregadora, existencialista e libertária do lendário Clube da Esquina, do qual Guedes e Bastos foram sócio-fundadores. Uma de nossas cantoras mais interessantes, cuja voz toca o timbre de um jovem Beto Guedes em alguns momentos, Jussara espana qualquer possível poeira acumulada na longa estrada do tempo que separa as canções lançadas pelo artista mineiro nos discos ‘A página do relâmpago elétrico’ (1977), ‘Amor de índio’ (1978), ‘Sol de primavera’ (1979), ‘Contos da lua vaga’ (1981) e ‘Viagem das mãos’ (1984). Os belos arranjos de Sacha Amback atualiza...

Musa de qualquer geração, Gal chega aos 70

Nascida no dia 26 de setembro de 1945, no bairro da Graça, na cidade de Salvador, no estado da Bahia, Maria da Graça Costa Pena Burgos surgiu na cena musical soteropolitana na década de 1960. Ainda era Gracinha quando conheceu o futuro parceiro artístico, Caetano Veloso, e o ídolo João Gilberto que, embevecidos pelo frescor e afinação de seu canto moderno, afirmaram que ela era a maior cantora do Brasil. Em 1967, já com o nome artístico de Gal Costa lançou seu primeiro long play , dividido com Caetano. ‘Domingo’ rendeu à dupla o primeiro clássico, ‘Coração vagabundo’. Pouco depois a suavidade bossanovista deu lugar ao canto gutural e roqueiro. Era preciso estar atento e forte. Musa do movimento Tropicalista, Gal viu seus companheiros, Gilberto Gil e Caetano Veloso, partirem para o exílio londrino. Em plena ditadura militar, ela lotava o Teatro Tereza Rachel durante as históricas apresentações do show ‘Fa-Tal, Gal a todo vapor’. “Quero ver de novo a luz do sol!”, cantava naqueles te...

Tributo 'Gonzaguinha presente' peca pela ausência de emoção

Luiz Gonzaga Jr. (1945 – 1991) faria 70 anos no dia 22 de setembro de 2015. Para lembrar a data a Universal Music lança ‘Gonzaguinha presente – Duetos’, disco em que a voz do cantor e compositor carioca foi retirada das gravações originais e colocada em novos registros, com novos arranjos e com as participações especiais de artistas vinculados a vários de gêneros musicais. O projeto dirigido por Miguel Plopschi passa ao largo das canções de protesto, como ‘Comportamento geral’ e ‘Um sorriso nos lábios’, que caracterizaram o começo da carreira de Gonzaguinha.   O repertório segue a trilha dos sucessos românticos e dos sambas mais ensolarados. ‘Não dá mais pra segurar (Explode coração)’ ressurge na voz surpreendentemente contida de Ana Carolina. Quem também deixa de lado os exageros interpretativos – e a gaiatice – é Ivete Sangalo, que se sai bem em ‘Sangrando’, música-tentação para cantoras chegadas ao exibicionismo vocal e ao drama. Única faixa que mantém o arranjo original, ‘Gr...

Dona Ivone Lara tem sua bela trajetória contada em bom livro

Parte integrante do ‘Sambabook’ dedicado à artista, o livro ‘ Dona Ivone Lara - A Primeira-dama do samba’, escrito pelo jornalista Lucas Nóbile, segue na cadência bonita das composições da grande sambista carioca. Lucas esmiúça a criação de cada um dos doze discos lançados por Dona Ivone, ao longo de 41 anos de carreira, contados a partir da gravação de ‘Tiê’ no disco coletivo ‘Quem samba, fica? Fica’, em 1974. Foi a partir da gravação do LP produzido por Oswaldo Sargentelli, que Yvonne Lara da Costa, aos 48 anos de idade, viu seu nome ser encurtado e precedido (contra a sua vontade) pelo substantivo de cunho senhorial. O livro também refaz sua trajetória de vida, que começou no dia 13 de abril de 1922, e não um ano antes, como consta na maioria das publicações sobre a artista, inclusive em seu site oficial. O acréscimo de um ano, feito por sua mãe, possibilitou-lhe o ingresso no colégio interno. Foi no Colégio Municipal Orsina da Fonseca, no bairro da Tijuca, que a jovem estudou ...