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Luiz Melodia volta ao samba e outras bossas no CD 'Zerima'

Autor de clássicos do repertório de Gal Costa (‘Pérola Negra’, 1971) e Maria Bethânia (‘Estácio Holly Estácio’, 1972), Luiz Melodia surgiu na década de 1970 como um novo sambista vindo do berço de Ismael Silva (1905 – 1978). Mas o cantor do Morro de São Carlos, bairro do Estácio, logo se mostrou arredio à categorização limitadora, afinal, sua voz, cujo timbre se equilibra entre o cortante e o aveludado, se prestava a voos para além dos terreiros e fundos de quintais cariocas. Como consequência, Melodia dividiu com outros artistas igualmente refratários aos esquemas preconcebidos pelas gravadoras, o título de “maldito” – o que de certa forma pode ter prejudicado sua discografia. A partir da estreia impecável, com o álbum ‘Pérola negra’ (1973), Luiz viu sua carreira fonográfica, volta e meia ser pontuada por regravações e novas tentativas de enquadramentos. Seu primeiro e único disco de ouro veio apenas em 1999, com o CD ‘Acústico ao vivo’ (Índie Records), quando, não por acaso, revis...

A radicalidade dos quintais de Maria Bethânia

“O arco da velha índia/ É corda vocal insubmissa/ Rabeca de uma corda/ Que em desacordo atiça/ A aldeia contra o futuro/ Duro de dar dó/ E preguiça”. Os versos de ‘Arco da velha índia’, uma das duas canções de Chico César presentes em ‘Meus quintais’ (Biscoito Fino), novo CD de Maria Bethânia, resumem o sentimento que vem pautando a produção artística da cantora há mais de uma década. Desde o festejado ‘Brasileirinho’ (2003), a baiana de Santo Amaro da Purificação voltou-se de maneira cada vez mais radical para um Brasil interiorano, caboclo, indígena, afro-brasileiro, folclórico, religioso – e idealizado –, marcando diferenças diante da modernidade futurista, dura de dar dó e preguiça. A mais autoral de nossas intérpretes entrelaça, urde, com paciência e precisão de artesã, discos que imprimem seu pensamento, sua postura artística – e política, mesmo – perante o Brasil e o mundo. Um tempo-espaço cheio de emoções que parecem inalcançáveis para as novas gerações. ‘Folias de reis’ (Ro...

Caetano Veloso inaugura versão brasileira de iTunes Session

Coube a Caetano Veloso inaugurar a versão brasileira da série ‘iTunes Session’, disponível a partir de terça-feira, 27 de maio de 2014, na loja digital da Apple. Gravado ao vivo em estúdio, em outubro ao ano passado, o álbum apresenta oito versões inéditas do incansável baiano.  São músicas de diferentes épocas, já registradas pelo artista. A exceção é ‘De manhã’ (Caetano, 1965), do disco de estreia de Maria Bethânia.  O belo samba sessentista ganha sonoridade contemporânea, pontuada pela guitarra de Pedro Sá, um dos vértices da Banda Cê, presente nos renovadores CDs lançados por Caetano a partir de 2006. Sá injeta suingue em ‘13 de maio’ (Caetano, 2000), outro destaque de ‘iTunes Session Caetano Veloso’, cuja primeira faixa, ‘Livros’ (Caetano, 1997) soa tão interessante quanto a gravação original. Os músicos Marcio Victor (percussão), Danilo Tenebaum (baixo) e Nilton César (bateria) completam o quarteto que acompanha Caetano neste trabalho. O violão do eterno discípulo j...

'Código Daúde' mostra que a cantora continua a tal

Neste populoso país das cantoras nem sempre os louros do reconhecimento popular recaem sobre quem merecidamente dá continuidade a excelência interpretativa, marca registrada de nossas aves canoras. A estreia fonográfica da baiana Maria Waldelurdes Costa de Santana Dutilleux, nos anos 1990, apontava para o surgimento de uma nova estrela radiante da MPB. O canto potente e esperto, e o repertório fresco, misturando tradição e modernidade, conquistaram críticos e formadores de opinião. Suas solares versões para ‘Chove chuva’ (Jorge Ben Jor), ‘Hoje eu quero sair só’ ( Mu Shebabi /  Caxa Aragão /  Lenine ) e ‘Não identificado’ (Caetano Veloso) ganharam a programação musical de rádios do segmento adulto contemporâneo. As impactantes apresentações ao vivo confirmavam que a mulata era a tal. Inexplicavelmente o estrelato não se confirmou e aos poucos Daúde foi saindo da cena brasileira, ainda que tenha seduzido o mercado internacional – seu terceiro CD, ‘Neguinha te amo’ (R...

Bem acompanhado, Tárcio lança seu terceiro álbum, 'Escuta'

Um hiato de quase onze anos separa ‘Escuta’, o novo álbum do cantor e compositor Tárcio, de ‘Congraçamento’, CD lançado em 2003. Aposta do selo Marrom Music, de Alcione, distribuído pela gravadora Biscoito Fino, o disco que traz no título a composição de Johnny Alf é um convite aos ouvidos mais sensíveis, não embotados por “the voices” contemporâneas. Sofisticado, ‘Escuta’ também passa à margem das desconstruções modernosas, tão exaltadas ultimamente. Muito bem acompanhado por músicos excepcionais como Jorge Helder, Jurim Moreira, Zé Canuto, Ricardo Silveira, Armando Marçal e Ernie Watts, Tárcio coloca sua voz elegante a serviço de clássicos da música brasileira e de composições autorais. A envolvente ambiência cool, predominante em todas as faixas, expõe o refinamento musical do artista carioca. O doce balanço perpetuado pela Bossa Nova ressurge renovado nos belos arranjos assinados por Hélio Delmiro, Luiz Avellar e Durval Ferreira (1935 – 2007). O suingue marcante de ‘A rã’ ...

A convincente estreia fonográfica da banda Radiolaria

Eternizadas pelo famoso “clube” fundado por Milton Nascimento e companhia, as esquinas de Minas Gerais continuam servindo de cenário para interessantes alquimias musicais. Bossa Nova, pop, rock progressivo, folk e, claro, MPB são ingredientes de ‘Vermelho’, bom álbum de estreia do Radiolaria, grupo notadamente influenciado pelo som do Clube da Esquina. Pontuado por vigorosas guitarras, consistentes melodias e harmonias acima da média, ‘Vermelho’ também apresenta letras de forte apelo poético. Produzido por Thiago Corrêa e Henrique Matheus, integrantes do grupo Transmissor, o disco pode ser baixado no site da banda ( www.radiolaria.com.br ), formada por Felipe Barros (voz e guitarra), Felipe Xavier (voz, violão e guitarra), Luiz Eduardo Lobo (bateria e percussão) e Wagner Costa (voz e baixo). Nuances setentistas colorem a maioria das faixas, que também dialogam com a música dos Beatles e o rock de sotaque rural, sem perda de contemporaneidade. Faixas como ‘O menino cresceu’ (Felipe ...

Diogo Poças faz boa música brasileira em 'Imune'

Segundo CD do cantor e compositor Diogo Poças, ‘Imune’ (Favelinha Redords/ A musicoteca) apresenta ambiência cool, que combina perfeitamente com a voz miúda do moço paulistano. A delicada sonoridade álbum produzido por Leonardo Mendes é elegante, com seu samba cheio de bossa, como ‘Senhora rainha’ (Diogo Poças/ Edgard Poças), distante dos fundos dos quintais cariocas. Basicamente autoral, o coerente repertório (de apenas nove canções) contribui para que ‘Imune’ soe agradável à primeira audição. Filho do maestro Edgard Poças e irmão da cantora e compositora Céu, Diogo divide as boas ‘Feitiço da Vila Madalena’ (Diogo Poças/ Edgard Poças) e ‘Imune’ (Diogo Poças/ Jesses Santos/ Marcos Tanaka) com o pai e a irmã, respectivamente. O suave clima familiar se completa com ‘Nina’ (Edgard Poças), acalanto dedicado à filha. Única regravação, ‘O perdão’ (Roberto Mendes/ J. Velloso, 1994) se revela excelente abre-alas do CD, cujo nível se mantém elevado em faixas como ‘Mais um lamento’ (Cé...