Clara Nunes (1942 – 1983) viu sua carreira deslanchar na década de 1970, quando trocou os boleros e um romantismo acentuado pela cadência bonita do samba, uma mudança idealizada pelo radialista e produtor musical Adelzon Alves. Depois do sucesso do LP ‘Alvorecer’, de 1974, impulsionado pelas faixas ‘Menino deus’ (Mauro Duarte/ Paulo César Pinheiro), ‘Alvorecer’ (Délcio Carvalho/ Ivone Lara) e ‘Conto de areia’ (Romildo/ Toninho Nascimento), a cantora mineira reafirmou sua consagração popular com o álbum ‘Claridade’. Lançado em 1975, este disco vendeu 600 mil cópias, um feito excepcional para um disco de samba, para uma cantora e, sobretudo, para um disco de samba de uma cantora.
Traço marcante na trajetória artística e na vida de Clara Nunes, o sincretismo religioso está presente nas faixas ‘O mar serenou’ (Candeia) e ‘A deusa dos orixás’, do pernambucano Romildo e do paraense Toninho Nascimento, os mesmos autores de ‘Conto de areia’. Eles frequentavam o célebre programa no qual Adelzon Alves promovia a música popular brasileira e, especialmente, o samba nas madrugadas da Rádio Globo, no Rio de Janeiro. Foi nos estúdios da emissora que Clara ouviu ‘Conto de areia’, primeira das oito composições da dupla que gravaria, a última delas no derradeiro álbum ‘Nação’, de 1982.
Lançado por seu compositor, Nelson Cavaquinho, em 1973, o futuro
clássico ‘Juízo final’ (em parceria com Élcio Soares) reluziu definitivamente
na voz de Clara. “O sol há de brilhar mais uma vez/ A luz há de chegar aos
corações”, previam os versos esperançosos naqueles tempos sombrios. Além de Nelson,
um dos compositores preferidos da cantora, outro proeminente mangueirense está
presente. É de Cartola o samba ‘Que sejas bem feliz’.
Os compositores da Portela, escola de samba carioca com a qual seu nome
seria para sempre associado, são representados por Candeia que, além do sucesso
‘O mar serenou’, assina o tristíssimo ‘O último bloco’. Portelense de primeira
hora, Alberto Lonato assina ‘Sofrimento de quem ama’. Monarco e Walter Rosa são
os autores de ‘Vai amor’.
Em ‘Claridade’, ela grava pela primeira vez uma parceria de Paulo César
Pinheiro e João Nogueira, o samba malandro ‘Bafo de boca’, e lança mais uma
composição de Pinheiro e Guinga, a bela ‘Valsa do realejo’. Ela ainda relembra
o pioneiro Ismael Silva no samba amaxixado ‘Ninguém tem que achar ruim’. ‘Claridade’
foi o quinto e último disco de Clara produzido por Adelzon Alves. O seguinte, ‘Canto
das três raças’, já traria a assinatura de P. C. Pinheiro, com quem a cantora se
casou.
Lançado há 50 anos, ‘Claridade’ foi um marco na história da música
popular brasileira, cuja expressiva e inédita vendagem contribuiu para o
reconhecimento das cantoras, não apenas as sambistas.
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