Gravado
durante o exílio do artista baiano em Londres, o quarto LP de estúdio de Gilberto
Gil foi produzido por Ralph Mace para o selo Famous e editado no Brasil pela
Philips, atual Universal Music. O produtor inglês também trabalhava com Caetano
Veloso, que havia lançado seu primeiro disco de exílio no mesmo ano. Contrastando
com a melancolia expressada por Caetano, Gil fez um álbum mais equilibrado,
dosando as saudades do Brasil e as experiências vividas na efervescente cena
pop da capital britânica.
Instantâneos musicais daqueles dias, seis das oito canções (cantadas em inglês) eram inéditas, sendo três delas compostas em parceria com o cantor e compositor carioca Jorge Mautner. ‘Volkswagen Blues’, lançada no disco ‘Cérebro eletrônico’, de 1969, que retornou com novos arranjo e letra, e ‘Can’t Find May Way Home’, do cantor e compositor inglês Stevie Winwood, completaram o repertório. O vibrante violão de Gilberto Gil determinou o groove sedutor do disco, que contou ainda com percussão e guitarra elétrica tocados por Gil, e baixo e vocais de Chris Bonett.
O lado A traz o samba-rock-pop ‘Nêga (Photograph Blues)’, a psicodélica ‘The Three Mushrooms’ (Gil/Mautner) e a roqueira ‘Babylon’, além da já citada ‘Can’t Find My Way Home’, que ganhou outro significado ao ser cantada por um exilado político. A nova versão de ‘Volkswagen Blues’ abre o lado B, seguida da triste balada ‘Mamma’. A seguir, ‘One O’Clock Morning, 21th April 1971’, uma das melhores faixas do disco, com o violão de Gil marcando o passar das horas. A roqueira ‘Crazy Pop Rock’ (Gil/Mautner) encerra o álbum com otimismo: “I Only Gotta Sing Loud, Loud”. Cinco décadas depois, o disco ‘Gilberto Gil’ é mais uma prova da atemporalidade da arte do mestre baiano.
O encontro com Rita Lee

Já em 1977, Gil e sua comadre Rita
Lee fizeram o show ‘Refestança’, que passou por várias capitais brasileiras e
resultou em um LP gravado ao vivo, editado pela gravadora Som Livre no mesmo
ano. O baiano já havia lançado os discos ‘Refazenda’, em 1975, e ‘Refavela’, no
início de 1977, e definiu assim o novo trabalho com a paulistana: “Refestança é
um lugar. Em que se cantando dá. Em que se dançando dá. Em que se plantando… só
bananeira”. Naqueles tempos sombrios, o negócio era dançar (e cantar) pra não
dançar.
O
repertório traz ‘Refestança’, então inédita parceria da dupla, sucessos individuais
de cada um deles e de outros artistas, mais o presente de Rita para Gil, a
canção ‘Giló’. A bela interpretação de Gil para ‘Ovelha negra’, e a explosiva versão
de Rita para ‘Back in Bahia’ são pontos altos do álbum. Além da faixa-título, eles
também cantam juntos ‘Odara’ (Caetano Veloso), ‘Domingo no parque’ (revivendo a
histórica parceira surgida no III Festival da Record, em 1967) e ‘É proibido
fumar’ (Erasmo Carlos/ Roberto Carlos), ótima sacada dos compadres que haviam
tido problemas com a polícia no ano anterior por porte de maconha. Gil e Rita ainda
apresentam ‘De leve’, versão de ‘Get back’ (Lennon/ McCartney), que viria a ser
gravada por Lulu Santos no seu álbum de estreia, em 1982. Curiosamente, duas
canções de ‘Refestança’, ‘Eu só quero um xodó’ (Dominguinhos/ Anastácia), que
aparecera no lado B do compacto lançado por Gil em 1973, e ‘Arrombou a festa’
(Rita Lee/ Paulo Coelho), que fora incluída no lado A do compacto lançado por
Rita & Tutti Frutti em 1976, não fazem parte dos LPs de estúdio dos
respectivos artistas.
Produzido
por Guto Graça Mello, ‘Refestança’ também eternizou o encontro das superbandas
de Gilberto Gil, a Refavela – Moacir Albuquerque (baixo), Perinho Santana
(guitarra), Djalma Correia (percussão), Cidinho Teixeira (teclados), Carlos
Alberto Charlegre (bateria) e Lúcia Turnbull (vocal) – e de Rita Lee, a Tutti
Frutti – Luís Sérgio Carlini (guitarra), Roberto de Carvalho (teclados), Lee
Marcucci (baixo), Sérgio Della Monica (bateria), Wilson Pinto de Oliveira
(vocal), e Naila ‘Scorpio’ Mello (percussão). Registro da festiva reunião dos
geniais artistas, ‘Refestança’ finalmente ganha o formato digital.
Oportunamente
reeditados pela Universal Music, ‘Gilberto Gil (1971)’ e ‘Refestança (1977)’
são joias da discografia de Gilberto Gil, cuja obra excepcional já está
imortalizada.
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