Com suas faixas banhadas por águas doces e salgadas, de chuvas, rios,
mares e lágrimas, o segundo disco do artista pernambucano Zé Manoel impressiona.
Viabilizado pelo projeto Natura Musical, produzido por Carlos Eduardo Miranda e
por Kassin, ‘Canção e silêncio’ apresenta músicas aparentemente antiquadas
para os nossos ruidosos dias – “A maior ambição da canção é ser silêncio”,
dizem os versos de ‘A maior ambição’ (Zé Manoel/ Juliano Holanda). São
composições cheias de melancolia interiorana, embora não reneguem o lado urbano,
como se unissem Petrolina e Recife, as cidades de Zé Manoel. Versos geralmente
curtos e intensos, revestidos por melodias marcantes, são o passaporte para uma
viagem atemporal por paisagens muitas vezes cinematográficas. Caso da épica
‘Sereno mar’, cujo arranjo de Letieres Leite, maestro da Orkestra Rumpillez, realça
as influências do mestre baiano, Dorival Caymmi (1914 – 2008). Águas que levam
o pescador, mas que depositam na areia líricos “cachos de estrelas marinhas”,
como nos versos da ciranda ‘O mar’ (Zé Manoel/ Sergio Napp). Nascida em outras
praias, a Bossa Nova também está presente, em ‘Cada vez que digo adeus’ (Zé
Manoel/ Paulo Mello). ‘Água doce’ é um baião levado apenas pelo piano de Zé
Manoel, que parece tirar das teclas o som dos pingos da chuva. O rio São
Francisco surge em ‘Quem não tem canoa cai n’água’, que traz a voz ribeirinha de Dona Amélia, do Samba de Véio da Ilha do
Massangano. ‘Estrela nova’, bela e inesperada parceria de Zé Manoel e da
artista carioca Dulce Quental, encerra o álbum. Além de compor e cantar, Zé
Manoel toca um personalíssimo piano, formando com Kassin (baixo) e Tutty Moreno
(bateria) o luxuoso trio base de ‘Canção e silêncio’. Cordas e instrumentos
adicionais surgem quando necessários. Nada de excessos, tudo limpo e coeso,
tudo feito com sedutora placidez e segurança pelo timoneiro Zé Manoel.
A Universal Music reabre seu baú de preciosidades. Desta vez, a dona do maior acervo musical do país, traz duas joias do cantor, compositor e violonista Gilberto Passos Gil Moreira, recentemente eleito imortal pela Academia Brasileira de Letras. De 1971, o disco londrino, ‘Gilberto Gil’, reaparece em nova edição em vinil, enquanto ‘Refestança’, registro do histórico encontro de Gil e Rita Lee, de 1977, finalmente ganha versão digital. Gravado durante o exílio do artista baiano em Londres, o quarto LP de estúdio de Gilberto Gil foi produzido por Ralph Mace para o selo Famous e editado no Brasil pela Philips, atual Universal Music. O produtor inglês também trabalhava com Caetano Veloso, que havia lançado seu primeiro disco de exílio no mesmo ano. Contrastando com a melancolia expressada por Caetano, Gil fez um álbum mais equilibrado, dosando as saudades do Brasil...
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