Presença bissexta nos palcos da cidade, Mônica Salmaso encantou
o público que lotou o Teatro Tom Jobim, no Jardim Botânico, Rio de Janeiro,
para assistir à estreia carioca do show ‘Corpo de baile’ na noite de sábado, 27
de junho de 2015. Para interpretar as 14 canções de Guinga e Paulo César
Pinheiro, que constituem o belíssimo CD homônimo lançado em 2014, via gravadora
Biscoito Fino, a cantora paulistana se cercou dos ótimos músicos que
participaram da gravação do álbum: Teco Cardoso (sopros e direção musical),
Nailor Proveta (clarineta e saxofones), Paulo Aragão (violão), Nelson
Ayres (piano e acordeom), Neymar Dias (contrabaixo e viola caipira) e Quarteto
Carlos Gomes, formado por Cláudio Cruz (violino), Adonhiran Reis (violino),
Gabriel Marin (viola) e Alceu Reis (cello). O cineasta Walter Carvalho, que
dirigiu o DVD ‘Alma lírica’ (2012), assina o vídeo-cenário, cujas bonitas projeções
quase sempre se mostram bem integradas ao roteiro, que apresenta canções de
forte apelo visual, como o choro ‘Fim dos tempos’, que abre o disco e o show, o
não menos denso fado ‘Navegante’ e a delicada ‘Fonte abandonada’. Contudo, o
clima de encantamento advém mesmo do canto irretocável de Mônica Salmaso, que
ilumina outras belezas, como a nordestina ‘Porto de Araújo’, a ecológica
‘Quadrão’ e a indígena ‘Curimã’. Sua presença quase solene exerce um fascínio
respeitoso na plateia, que permanece no mais absoluto silêncio para explodir em
aplausos efusivos ao final de cada número – coisa rara em tempos de interatividade
exorbitante. Esse aparente rigor é quebrado pela própria cantora, que ao longo
da noite, tece espirituosos e bem-humorados comentários sobre as canções,
muitas delas guardadas há 40 anos. O requintado recital recria os preciosos arranjos
assinados por Tiago Costa, Luca Raele, Nelson Ayres, Teco Cardoso, Paulo
Aragão, Nailor Azevedo Proveta e Dori Caymmi com impressionante precisão, mas é
a luminosa voz de meio-soprano de Salmaso que torna tudo ainda maior, como
acontece especialmente em ‘Bolero de Satã’, ‘Nonsense’ e ‘Noturna’. A batida
ponteada do violão de Neymar Dias e as intervenções de Teco Cardoso nos sopros elevam
a temperatura de ‘Violada’, número em que Mônica se acompanha com um
pandeiro, tocado com natural elegância. Leveza que também é impressa em
‘Sedutora’ e em ‘Rancho das sete cores’. A comovente ‘Procissão da padroeira’
precede a música-título, ‘Corpo de baile’, que encerra o show. Gravada em seu
terceiro disco, ‘Voadeira’ (1999), a modinha ‘Senhorinha’, também assinada por
Guinga e Paulo César Pinheiro, é o delicado e coerente bis, que embevece ainda
mais o público. Ave rara neste vasto país das cantoras, Mônica não abre mão de
suas convicções artísticas, conduzindo sua carreira com uma coesão
impressionante. O Brasil deveria conhecer o Brasil de Mônica Salmaso.
A Universal Music reabre seu baú de preciosidades. Desta vez, a dona do maior acervo musical do país, traz duas joias do cantor, compositor e violonista Gilberto Passos Gil Moreira, recentemente eleito imortal pela Academia Brasileira de Letras. De 1971, o disco londrino, ‘Gilberto Gil’, reaparece em nova edição em vinil, enquanto ‘Refestança’, registro do histórico encontro de Gil e Rita Lee, de 1977, finalmente ganha versão digital. Gravado durante o exílio do artista baiano em Londres, o quarto LP de estúdio de Gilberto Gil foi produzido por Ralph Mace para o selo Famous e editado no Brasil pela Philips, atual Universal Music. O produtor inglês também trabalhava com Caetano Veloso, que havia lançado seu primeiro disco de exílio no mesmo ano. Contrastando com a melancolia expressada por Caetano, Gil fez um álbum mais equilibrado, dosando as saudades do Brasil...
Comentários