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'Live in London' eterniza o frescor tropicalista de Gal e Gil

Verdadeira joia atemporal, o CD duplo ‘Gilberto Gil & Gal Costa – Live in London ‘71’, lançado pelo selo Discobertas, do pesquisador musical Marcelo Fróes, eterniza um raríssimo show dos então jovens artistas baianos na City University, Londres, Inglaterra, no dia 26 de novembro de 1971. O registro histórico e surpreendente, encontrado por Fróes, em 1998, foi dividido em dois CDs.
No primeiro, Gal, acompanhada por Gil (violão/ vocais), Bruce Henry (baixo), Tutty Moreno (bateria) e Chiquinho Azevedo (percussão), apresenta repertório baseado no show ‘Fa-tal, a todo vapor’, que marcou definitivamente sua carreira naquele mesmo ano, em concorridas noites no Teatro Tereza Raquel, em Copacabana, Rio de Janeiro. Transbordando frescor, a cantora mostra o que é que a baiana tem em vibrantes interpretações de músicas que se tornariam clássicas, como ‘Coração vagabundo’ (Caetano Veloso) e ‘Vapor barato’ (Jards Macalé/ Waly Salomão), esta com pulsação roqueira, graças à batida do violão de Gil. O (agora) quinto registro oficial de ‘Vapor Barato’ é o que mais se aproxima da versão à la Rolling Stones, lançada por Gal em compacto, também em 1971. ‘Como dois e dois’ (Caetano Veloso) se destaca graças às mudanças sutis, como a linda improvisação no final da canção. A cantora eleva o tom com suavidade, em contraponto aos graves de Gil, alterando entonações, criando um efeito impactante. O esfuziante dueto dos baianos em ‘Sai do sereno’ (Onildo Almeida) ganharia registro oficial em ‘Expresso 2222’, disco lançado por Gil na volta do exílio, em 1972. Hino da juventude da época, ‘Dê um rolê’ (Moraes Moreira/ Luiz Galvão) rivaliza em liberdade criativa com o medley ‘Maria Bethânia’ (Caetano Veloso)/ ‘Bota a mão nas cadeiras’ (tradicional), em que Gal canta os versos sacanas “come eu mainha/ eu queria ser um homem pra comer você todinha”. Puro amor, da cabeça aos pés. O clima esquenta com ‘Chuva, suor e cerveja’ (Caetano Veloso) para, em seguida, Gal modernizar a ‘Falsa baiana’ (Geraldo Pereira) com espertas improvisações e scats de Gil. Música gravada no disco ‘Legal’ (1970), ‘Acauã’ (Zé Dantas) é recriada mantendo o efusivo ambiente do show. Ali está a cantora que serve de modelo a tantas novatas desde então; mas é difícil encontrar alguma que se aproxime de sua naturalidade.
No segundo disco, Gilberto Gil abusa (ainda mais) da informalidade em longas faixas, cheias de improvisações. O baiano apresenta ‘Expresso 2222’ (Gilberto Gil) e ‘Oriente’ (Gilberto Gil), canções que ganhariam registros definitivos no álbum ‘Expresso 2222’, de 1972. Recria ‘Procissão’ (Gilberto Gil/ Edy Star), ‘Aquele abraço’ (Gilberto Gil) e ‘Viramundo’ (Gilberto Gil/ Capinam) e apresenta uma nova composição, ‘Brand new dream’, que permaneceu inédita até agora. Ela seria lançada num segundo disco, que Gil pretendia gravar em Londres, logo esquecido com sua volta ao Brasil, meses depois deste show. Do LP londrino, de 1971, surge ‘One o’clock last morning, 20th april, 1970’. Imprimindo pegada roqueira o violão, Gilberto tropicaliza Lennon e McCartney (‘Sgt. Pepper’s lonely hearts clube band’) e Jimi Hendrix (‘Up from the skies’). Para os amantes da música brasileira, o CD duplo ‘Gilberto Gil & Gal Costa – Live in London ‘71’ já nasceu clássico.

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