“...
E melhor do que o silêncio só João”, sentenciou o discípulo Caetano Veloso em
‘Pra ninguém’ (1997), ao citar João Gilberto, cuja interpretação sabiamente
(instintivamente?) é valorizada pelas pausas do velho mestre baiano, criador da
famosa batida de violão que deflagrou a Bossa Nova. O ‘arpoador’ do carioca Leo
Tomassini é banhado por ondas silenciosas desde sempre existentes nas obras dos
baianos João, Caetano e Dorival Caymmi (1914 – 2008). A música do
santo-amarense é, aliás, mina d’água das composições e do canto de Leo, que divide
os vocais com o mestre em ‘elizabeth’ (Leo Tomassini), na qual o elegante flugel do músico
Leandro Joaquim cita ‘Lindeza’ (Caetano Veloso).
A
bossa de violões cheios de bossa (de Pedro Sá, Mig Martins, Guinga, Nelson
Jacobina, Rubinho Jacobina e Marcos Alves) perpassa a quase totalidade das
faixas do segundo álbum solo de Tomassini, ex-Família Roitman, e convida o
ouvinte a um mergulho nas águas tépidas da canção sem fronteiras, não obstante
o brasileiríssimo samba ser o seu principal condutor. Na praia de Leo também
chega o som norte-americano, representado por ‘american love song way’ (Leo Tomassini/Marcos Alves) e por
‘dance with me’ (Leo Tomassini), esta reproduzindo o vai-e-vem hipnótico das ondas como fundo
para a voz miúda e bem colocada de Leo Tomassini, aluno aplicado da escola musical de artistas
como Mario Reis, João Gilberto e... Caetano.
O
clima cool de ‘arpoador’ realçado por elegantes arranjos na faixa-título e em
‘feitiço’ (Leo Tomassini), contrasta com versos arrebatados, inspirados na musa
‘garbosa’ (Leo Tomassini), que arrasta a sandália no remexido ‘é garoa’ (Leo
Tomassini/Rubinho Jacobina). Seja rainha de rubros lábios, ‘elizabeth’, ou moça que provoca ciúmes em ‘tomara que caia a blusa’ (Leo
Tomassini/Rubinho Jacobina/Mauro Aguiar), a mulher adorada está quase sempre
presente, e sua ausência ‘arde’ (Leo Tomassini) no peito enamorado do
compositor. Mas “toda alegria do mundo” reaparece quando Iaiá chega (‘samba
naif’, Leo Tomassini). Em ‘eu te amo – canção de despertar’ (Leo Tomassini), a
musa torna-se híbrida ao partilhar com Caetano Veloso o panteão musical erigido
por Tomassini. Leo ainda divide outras pérolas que compõem ‘arpoador’, com o
virtuoso Guinga, em ‘queira, não queira’ (Leo Tomassini), e com Nelson Jacobina
(1953 – 2012), arranjo e violões em ‘estreia’. Nesses dias quentes na cidade
maravilha, purgatório da beleza e do caos, um mergulho no ‘arpoador’ é mais que
bem-vindo.
Comentários