Depois de sua peculiar incursão pelo samba,
Adriana Calcanhotto volta a reencarnar Partimpim e lança seu terceiro disco
dedicado ao público infantil. O repertório composto predominantemente por
regravações – apenas quatro canções são inéditas – recria clássicos, numa
espécie de ‘Aquarela brasileira’, célebre série gravada por Emílio Santiago ao
longo dos anos 1980/1990.
Partimpim recorre à trilha sonora do seriado
televisivo ‘Sítio do pica-pau amarelo’, de onde retira as pérolas ‘Passaredo’
(Francis Hime/ Chico Buarque, 1975) e ‘Tia Nastácia’ (Dorival Caymmi, adaptação
de 1975). ‘Acalanto’, outra do mestre Dorival, encerra o CD que traz ainda ‘Taj-Mahal’
(Jorge Ben Jor, 1972), ‘Lindo lago do amor’ (Gonzaguinha, 1984), ‘O pato’
(Jayme Silva/ Neusa Teixeira, 1965) e ‘De onde vem o baião’ (Gilberto Gil,
1977), sem que as novas versões justifiquem tais escolhas em um álbum infantil.
A bonita ‘Também você’ (João Callado/ Adriana
Partimpim) é o destaque entre as inéditas. Parceria de Partimpim e Paula
Toller, ‘Salada russa’ parte de uma ideia interessante, os nomes contraditórios
da gastronomia nacional como a salada russa que não existe na Rússia, mas a boa
sacada perde-se num desfecho sem graça, parecendo ter sido terminada às pressas.
Numa época em que letras como “Eu meto tudo,
eu pego firme pra valer/ Chego cheio de maldade, eu quero ouvir você gemer” (‘Amor
de chocolate’, do funkeiro Naldo) são cantadas por crianças de todas as idades, e muitos pais acham normal, fica difícil imaginar qual é o público de canções como ‘Criança crionça’ (Cid
Campos/ Augusto de Campos) e ‘Por que os peixes falam francês?’ (Alberto
Continentino/ Domenico Lancellotti). Quem sabe bebês, ou crianças criadas em
cárcere privado, longe da mídia? O universo funk rendeu à Partimpim seu
primeiro sucesso, ‘Fico assim sem você’ (Abdulah/ Cacá Moraes), oportunamente
pescada do repertório da extinta dupla ‘Claudinho e Buchecha’.
Mas o que mais chama atenção é a falta de
vigor nas interpretações. Fazendo um CD para os pequenos, Adriana se esqueceu
de uma das principais características infantis – a espontaneidade. Tudo em ‘Partimpim
tlês’ é muito pensado, cool. Contraditoriamente,
a sonoridade é limpa demais, apesar do excesso de barulhinhos e interferências.
O terceiro disco de série lúdica de Adriana parece ter sido feito para virar
DVD, afinal os recursos cênicos dos shows são sempre envolventes, mais do que
sua esmaecida aquarela sonora. Tudo se resolve no palco, o que ilustra a
dualidade da produção musical contemporânea, que dialoga com outras artes e
parece precisar cada vez mais de embalagens sedutoras. A canção por si só não
basta. Talvez inadvertidamente, Partimpim tenha metido a mão em cumbuca, sem
pensar nos perigos, numa atitude comum a crianças de qualquer idade.
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