Pular para o conteúdo principal

Tulipa, livre, leve e solta



Dois anos após o promissor álbum de estreia, ‘Efêmera’, Tulipa Ruiz lança seu esperado segundo disco. Disponível para downloads no site oficial da artista, ‘Tudo tanto’ traz 11 composições inéditas assinadas por ela. Ainda que os temas explorados nas canções sejam por vezes intensos, há em ‘Tudo tanto’ uma leveza contagiante. Tulipa exala um frescor inexistente em muitas novatas que já nascem meras cópias de alguma cintilante estrela do vasto céu da MPB. No caso de Tulipa, não há apenas uma influência, há multiplicidade de referências sem que nenhuma delas se sobressaia a ponto de interferir inadequadamente em sua música. Destaque da cena indie, tão característica das novas gerações de músicos, sobretudo de São Paulo, Tulipa faz Música Pop Brasileira contemporânea, verdadeira lufada de ar fresco que poderia arejar as programações musicais das rádios, viciadas nas dores de amores de Anas, Marisas e congêneres.
Tulipa imprime outros tons na batida discussão do relacionamento amoroso. Com ela o papo é reto: “Pode ser ou é/ De algum jeito a gente se deu bem/ Com tempo pra respirar/ Com tempo pra ser bem mais que dois”, define em ‘É’ (Tulipa Ruiz). No ‘Script’ (Tulipa Ruiz/ Gustavo Ruiz) da paulista criada em Minas o amor é ensolarado: “Devo lhe dizer que a vida é curta/ Que eu amei você e amei sem culpa”, entrega. ‘Desinibida’ (Tulipa Ruiz/ Tomás Cunha Ferreira), a moça usa seu adorável timbre e sua impecável afinação para flertar com a bossa nova, o reggae e o rock alternativo, fugindo de possíveis rótulos asfixiantes: sua música apresenta novidade.
As inevitáveis expectativas criadas em torno do segundo disco foram bem digeridas pela cantora e compositora. “Quando eu achar o que quero achar/ Você vai saber”, avisa na deliciosamente pop ‘Quando eu achar’ (Tulipa Ruiz/ Gustavo Ruiz). Ela sabe que tem “Tudo pra ser aquilo tudo que todo mundo espera”, mas consciente constata o “tanto que falta para ficar ok”, em ‘Ok’ (Tulipa Ruiz/ Gustavo Ruiz). Em um disco repleto de possíveis sucessos, a presença do maior hitmaker do pop nacional, Lulu Santos, em ‘Dois cafés’ (Tulipa Ruiz/ Gustavo Ruiz) reforça a qualidade da música de Tulipa. Música feita para tocar no rádio, como ‘Expectativa’ (Tulipa Ruiz/ Gustavo Ruiz) e ‘Bom’ (Tulipa Ruiz/ Gustavo Ruiz), dos ótimos versos “Nem sempre dá pra ser bom/ Quando não tá tão bom”, que parecem conectados aos de ‘Toda forma de amor’, dele, Lulu Santos: “não desejamos mal a quase ninguém”.
A leveza cede espaço para dois momentos de maior densidade em ‘Like this’ (Tulipa Ruiz/ Ilhan Ersahin) e em ‘Víbora’ (Tulipa Ruiz/ Criolo/ Caio Lopes/ Gustavo Ruiz/ Luiz Chagas), faixas nas quais a cantora explora sua voz em agudos e vocalizes impactantes. Tulipa também floresce em tons mais sombrios.
Produzido por Gustavo Ruiz, com belos e inventivos arranjos de cordas e madeiras assinados por Jacques Mathias, ‘Tudo tanto’ tem seu ótimo desfecho com ‘Cada voz’ (Tulipa Ruiz): “Cada voz tem um tom/ Cada voz tem um som”, ensina a artista. Mas poucas são usadas de maneira tão arrebatadora como a de Tulipa Ruiz.  Depois de ‘Recanto’ (Gal Costa) e ‘Tabaroinha’ (Mariene de Castro), finalmente surge um novo disco para ficar rodando por um bom tempo na rádio da minha cabeça.

Comentários

Leonardo Davino disse…
Ainda não ouvi... deu vontade.

Postagens mais visitadas deste blog

Joias musicais de Gilberto Gil são reeditadas

               A Universal Music reabre seu baú de preciosidades. Desta vez, a dona do maior acervo musical do país, traz duas joias do cantor, compositor e violonista Gilberto Passos Gil Moreira, recentemente eleito imortal pela Academia Brasileira de Letras. De 1971, o disco londrino, ‘Gilberto Gil’, reaparece em nova edição em vinil, enquanto ‘Refestança’, registro do histórico encontro de Gil e Rita Lee, de 1977, finalmente ganha versão digital.             Gravado durante o exílio do artista baiano em Londres, o quarto LP de estúdio de Gilberto Gil foi produzido por Ralph Mace para o selo Famous e editado no Brasil pela Philips, atual Universal Music. O produtor inglês também trabalhava com Caetano Veloso, que havia lançado seu primeiro disco de exílio no mesmo ano. Contrastando com a melancolia expressada por Caetano, Gil fez um álbum mais equilibrado, dosando as saudades do Brasil...

50 anos de Claridade

Clara Nunes (1942 – 1983) viu sua carreira deslanchar na década de 1970, quando trocou os boleros e um romantismo acentuado pela cadência bonita do samba, uma mudança idealizada pelo radialista e produtor musical Adelzon Alves. Depois do sucesso do LP ‘Alvorecer’, de 1974, impulsionado pelas faixas ‘Menino deus’ (Mauro Duarte/ Paulo César Pinheiro), ‘Alvorecer’ (Délcio Carvalho/ Ivone Lara) e ‘Conto de areia’ (Romildo/ Toninho Nascimento), a cantora mineira reafirmou sua consagração popular com o álbum ‘Claridade’. Lançado em 1975, este disco vendeu 600 mil cópias, um feito excepcional para um disco de samba, para uma cantora e, sobretudo, para um disco de samba de uma cantora. Traço marcante na trajetória artística e na vida de Clara Nunes, o sincretismo religioso está presente nas faixas ‘O mar serenou’ (Candeia) e ‘A deusa dos orixás’, do pernambucano Romildo e do paraense Toninho Nascimento, os mesmos autores de ‘Conto de areia’. Eles frequentavam o célebre programa no qual Adelzon...

Atrás do Trio Elétrico*

A menos de dois meses do Carnaval, os ensaios técnicos na Marquês de Sapucaí e nas quadras das escolas de samba bombam e os blocos de rua se preparam. Mas existe uma turma de foliões que foge da batucada carioca, preferindo o agito baiano, embalados pelos trios elétricos. “Se você for sozinho vai encontrar muito carioca por lá”, diz o comerciante Roberto Alves, 32 anos, apaixonado pelo Carnaval da Bahia. Para ele, falta a organização na folia do Rio. “Fiquei aqui em 2008 e detestei”, conta o moço que participou de sua primeira micareta (Carnaval fora de época) em 1996, em Belo Horizonte. “Tenho uns cem abadás”, gaba-se Roberto, que já garantiu mais alguns para este ano. Outro carioca, Rodrigo Carvalho, 28 anos, começou a pagar pelos abadás em março do ano passado. “Vou para Salvador há quatro anos seguidos. O clima é ótimo, não é pesado como nas raves”, compara ele, que dividirá um apartamento com 14 amigos durante a folia dos trios. “O mais requisitado é o Me Abraça, o abadá cu...