‘A voz da mulher na obra de Guilherme
Arantes’ é o segundo disco-tributo idealizado pelo DJ Zé Pedro para sua
gravadora Joia Moderna. Iniciada com a homenagem a Taiguara (1945 – 1996), no
ano passado, a série traz agora vinte cantoras das mais diferentes gerações interpretando vinte canções da obra do músico paulista que vem sendo
merecidamente redescoberto. ‘A voz da mulher na obra de Guilherme Arantes’
marca, ainda, o início da parceria entre a Joia Moderna e o iTunes, que já
disponibiliza a edição digital do projeto, enquanto o CD chegará às lojas no
dia 29 de maio.
Além da interessante mistura de intérpretes,
Zé Pedro também acerta ao valorizar as letras, deixando de lado arranjos
datados, impregnados dos onipresentes teclados que fizeram muitos críticos
classificarem como brega a música de Guilherme.
Em 1982 as rádios brasileiras tocavam duas
canções deliciosamente pop que se tornariam clássicas. Escritas por Lulu Santos
e Guilherme Arantes, respectivamente, ‘Tempos modernos’ e ‘O melhor vai
começar’ anunciavam os novos ares respirados pela nação com o início da
abertura política. Oriundos das experimentações entre o rock progressivo e
música brasileira nos lendários grupos ‘Vímana’ e ‘Moto perpétuo’, os jovens
compositores seriam reconhecidos hitmakers a partir daquela década. Enquanto o
carioca Luiz Maurício saboreava seu primeiro sucesso, o paulistano Guilherme já
era conhecido nacionalmente graças aos hits ‘Meu mundo e nada mais’ e ‘Amanhã’,
incluídos nas trilhas sonoras das novelas ‘Anjo mau’ (1976) e ‘Dancing days’
(1978). Novas e irresistíveis baladas românticas colocaram a obra de Arantes em
oposição à alta dosagem de testosterona do efervescente pop rock tupiniquim da
época. Não por acaso, mais de vinte composições de Guilherme entraram em
trilhas sonoras de novelas.
Guilherme passou os anos 1990 praticamente
esquecido, embora seus antigos sucessos, principalmente as baladas mais
sentimentais, ainda permanecessem na programação das rádios FM. Este cenário
começou a mudar quando, no final da década seguinte, cantoras como Zélia Duncan
(‘Cuide-se bem’), Adriana Calcanhotto (‘Meu mundo e nada mais’) e Vanessa da
Mata (‘Um dia, um adeus') sintomaticamente passaram a incluir em seus
repertórios composições de Arantes.
Vanessa é uma das vinte cantoras escaladas
por Zé Pedro em ‘A voz da mulher na obra de Guilherme Arantes’. A
mato-grossense faz de ‘Cuide-se bem’ (1976) a mais radiofônica das faixas do
CD. Coube a Zizi Possi interpretar ‘Meu mundo e nada mais’ (1976), na qual
reafirma sua capacidade de recriar canções alheias, embora o resultado soe um
tanto solene. No quesito dramaticidade ninguém ganha de Fafá de Belém na
ecológica ‘Planeta água’ (1981). Assim como fez com ‘Desabafo’ (Roberto Carlos/
Erasmo Carlos) no especial ‘Elas cantam Roberto’ (2009), a exuberante paraense
coloca seu canto potente a serviço da canção sem firulas, acertando em cheio.
Outra veterana que se destaca é Ângela Ro Ro,
que faz sua gravação de ‘Amanhã’ (1977) rivalizar em beleza com a versão de Caetano Veloso no disco ‘Totalmente
demais’ (1986). Cida Moreira encara com bravura e costumeira teatralidade
‘Brincar de viver’ (Guilherme/ Jon Lucien, 1983), música lançada na trilha
sonora do especial infantil ‘Plunct plact zuuum’, na voz de Maria Bethânia. Grande cantora
que voltou ao mercado fonográfico graças à Joia Moderna, Célia realça a beleza
da obscura ‘O amor nascer’ (1982).
Lançada por Elis Regina em 1980, ‘Aprendendo
a jogar’ não encontrou na voz opaca de Maria Alcina intérprete à altura. A
despeito do arranjo reverente à gravação original, a sumida Verônica Sabino se
sai melhor em ‘Loucas horas’ (1986).
Cantoras de gerações mais recentes também se
destacam. É o caso da baiana Marcia Castro, que acerta ao imprimir um clima
cool na ensolarada ‘O melhor vai começar’ (1982). O som descolado e
contemporâneo de Sílvia Machete refresca ‘Cheia de charme’ (1985), ainda que o
grudento e pasteurizado arranjo original não saia da nossa cabeça. Mariana
Aydar se arrisca em ‘Águas passadas’ (1976) e se dá bem, indicando que o
caminho proposto em seu bom CD ‘Cavaleiro selvagem’ (2011) foi acertado. Marya
Bravo merece aplausos pela agudeza impressa na desconhecida ‘Vivendo com medo’
(1980).
As cantoras Aydel (‘Êxtase’, 1979), Tiê
(‘Pedacinhos’, 1983), Verônica Ferriani (‘Muito diferente’, 1989), Vânia Bastos
(‘Primaveras e verões’, 1989), Luciana Alves (‘Só Deus é quem sabe’, 1980),
Leila Pinheiro (‘Despertar do amor’, 1985), Fhernanda Fernandes (‘Toda vã
filosofia’, 1988) e Daniela Procópio (‘Canção de amor’, de Guilherme e J. C.
Costa Netto, 1988) completam a seleção escalada por Zé Pedro para trazer
merecidamente de volta à contemporaneidade parte expressiva da obra de
Guilherme Arantes, um dos reis do pop brasileiro. (Mais um) ponto para a Joia
Moderna!
Comentários
Seguinte, os discos do selo Jóia Moderna estão sendo lançados no Rio também? É fácil achá-los?
Pergunto, pois dificilmente encontro essas "jóias" nas lojas...
Quero muito ouvir esse do Guilheme Arantes, deve estar bem interessante.
Ele tem o merecimento!
Forte abraço,
Felício.