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Portela e Vila Isabel apresentam os melhores sambas de enredo de 2012



Lançado em dezembro de 2011, o CD ‘Sambas de enredo 2012’ (Universal Music) enfileira os 13 hinos que as escolas de samba do Rio de Janeiro defenderão no desfile do Grupo Especial do Carnaval carioca neste mês de fevereiro de 2012. Sem grandes novidades, a gravação traz a voz oficial da apuração da LIESA (Liga Independente das Escolas de Samba), Jorge Perlingeiro, anunciando cada escola no início das faixas, expediente usado no disco de 2005, quando o locutor oficial da Marquês de Sapucaí, Demétrio Costa, também identificava as agremiações.
Algumas bossas desnecessárias como guitarras e acordeões inseridos em determinadas faixas não comprometem a boa safra de sambas novamente gravados na Cidade do Samba com a participação do coro de cada escola já na primeira passagem, recurso que deveria ser abolido.  Enredos clássicos como África (Angola) e Bahia, ou mesmo o Maranhão novamente cantado pela Beija-Flor de Nilópolis, renderam sambas acima da média.  A atual campeã do Carnaval foi feliz na junção de dois sambas concorrentes que resultaram no hino deste ano. O refrão principal (“Na Casa Nagô a luz de Xangô, axé/ Mina Jêje/ um ritual de fé...”) é irresistível. Neguinho dá o habitual tom dramático ao samba sobre o Maranhão que já rendeu à escola o carnaval de 2001.
Unidos da Tijuca e Acadêmicos do Salgueiro prometem promover um verdadeiro forró na Sapucaí homenageando o centenário Luiz Gonzaga e cantando o cordel, respectivamente. Enquanto a escola do Boréu abusa das aspas para dar significado à letra, numa alegre melodia que foge da sonoridade mais pesada da era Paulo Barros, o Salgueiro traduz melhor o nordeste num samba que funciona a contento e não despreza a empolgação natural da escola.
A Mangueira resolveu “esconder” seus quatro (!) intérpretes – sim, Vadinho Freire veio se juntar a Zé Paulo Sierra, Luizito e Ciganerey – convocando a turma do homenageado bloco Cacique de Ramos para a gravação do samba. O resultado irregular prejudica o resultado do bom samba da verde-e-rosa.  Espera-se que a insistência no bordão ‘É surdo um, mané’, criado pelo presidente Ivo Meirelles, seja passageira.
Assinado, entre outros, pelo imperiano Arlindo Cruz, o samba de enredo da Unidos da Vila Isabel é obra-prima com seus ousados contracantos e achados poéticos e melódicos.  Angola é enredo que proporciona à escola de Noel reviver o clima fantástico de ‘Kizomba – A festa da raça’.
Apesar do primeiro verso (“Madureira sobe o Pelô”) um tanto acelerado, a Portela finalmente parece se livrar das composições simplórias e supostamente empolgantes dos últimos carnavais e traz o melhor samba de enredo do ano, quiçá deste (ainda) novo século. Três refrãos empolgantes, lirismo e boa melodia fazem do samba uma opção à recorrente padronização. Se der certo na Avenida pode ser a senha para que os compositores das demais escolas deixem de lado o mero copidesque das sinopses assinadas pelos carnavalescos.
A Imperatriz Leopoldinense conseguiu fugir das referências às obras literárias do homenageado Jorge Amado, mas acaba destacando mais as características da Bahia no samba bem defendido por Dominguinhos do Estácio. A homenagem ao pintor Cândido Portinari redeu um samba correto para a Mocidade Independente de Padre Miguel que, enfim, deixou de lado as bobagens apresentadas nos últimos anos. Mas nem todos os tributos funcionaram, caso da Renascer de Jacarepaguá, que cai na pieguice ao contar a vida do pintor Romero Brito.
Allan das Candongas, Alberto Varjão, Aloisio Vilar, Cadinho, Carlinhos Fuzil, Eduardo Conti, Fabiano, Márcio André Filho, Marquinhus do Banjo e Roger Linhares (ufa!) assinam o hino da União da Ilha do Governador. Tratra-se de mais um samba-frankstein, criado a partir de outros dois. Apesar das circunstâncias, o resultado soa agradável, principalmente pela boa interpretação de Ito Melodia.  
Escola das celebridades, a Acadêmicos do Grande Rio aposta na autoajuda relembrando o incêndio no barracão que prejudicou o desfile do ano passado e traz um samba insosso. “Eu sou guerreiro do bem” lembra a campanha publicitária da cervejaria que já serviu de enredo para a escola. Mas ninguém tira da Unidos do Porto da Pedra o troféu de enredo mais bizarro. Com seu "Da seiva materna ao equilíbrio da vida", a agremiação levará para a avenida o iogurte. Só em conseguir fazer um samba de enredo com esse tema, a escola de São Gonçalo já entrou para os anais do Carnaval carioca.
Desde que surgiu em 1968, no formato vinil, o disco com as gravações dos sambas de enredo segue registrando as transformações da manifestação cultural que ganhou notoriedade mundial. Ainda que não seja mais um campeão de vendas, continua seduzindo sambistas e aficionados.

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