Pular para o conteúdo principal

Virgínia Rodrigues, uma voz que o Brasil desconhece

Presença bissexta nos palcos cariocas, Virgínia Rodrigues faz hoje a segunda e última apresentação do show que estreou nesta quinta-feira, dia 24 de novembro de 2011, no Teatro Rival, na Cinelândia (RJ). A intérprete baiana exibe seu canto grandioso alinhando canções de sua discografia e testando um ou outro número para um próximo disco. Acompanhada pelo virtuoso violonista Alex Mesquita, com a participação do performático percussionista Marco Lobo, Virgínia encantou o pequeno público presente.
Desde a sua impactante estreia fonográfica com o álbum ‘Sol negro’ (1997), a cantora vem construindo uma delicada obra musical que inclui, entre outros, os sambas-reggae dos blocos afros de Salvador (BA), no CD ‘Nós’ (2000), e os afro-sambas de Baden Powell (1937 – 2000) e Vinicius de Moraes (1913 – 1980) – esplendidamente gravados no álbum ‘Mares profundos’ (2003).
O tom solene da voz de meio-soprano confere às interpretações de Virgínia profundidade e nuances insuspeitadas mesmo em uma canção mais recorrente como ‘Todo sentimento’ (Cristóvão Bastos/ Chico Buarque), que já mereceu os mais variados registros. Com a mesma verve criativa ela sublinha novas tonalidades na épica ‘Juízo final’ (Élcio Soares/ Nelson Cavaquinho) e na triste ‘Hora da razão’, do conterrâneo compositor Batatinha (1927 – 1997).
‘Tristeza e solidão’, ‘Berimbau’, ‘Tempo de amor’, ‘Consolação’ e ‘Canto de Xangô’ – os afro-sambas – têm sua nobreza ressaltada e engrandecem o roteiro que relembra a cinematográfica ‘Noite de temporal’ (Dorival Caymmi, 1957). A interação entre cantora e percussionista neste número gera um dos momentos mais sedutores da noite.
Como convém a uma sereia, Virgínia emprega todo o poder de seu canto para seduzir os ouvintes em canções como ‘Melodia sentimental’ (Heitor Villa-Lobos/ Dora Vasconcelos), preciosidade da música popular brasileira gravada por cantoras como Elizeth Cardoso, Zizi Possi e Maria Bethânia. De arrepiar, assim como a interpretação de ‘Amor meu grande amor’ (Ana Terra/ Ângela Ro Ro), pontuada por inspirados vocalizes.
O ótimo espetáculo – quase recital – termina com a buliçosa ‘Labareda’, outra de Baden e Vinicius, deixando no ar ecos do impacto causado pela imponente voz de Virgínia Rodrigues, belíssima cantora que ainda não foi devidamente descoberta pelo Brasil.

Comentários

ADEMAR AMANCIO disse…
Além de cantar com a voz de Deus,ela canta sempre como quem reza uma prece.todos os louvores prá tal baiana.

Postagens mais visitadas deste blog

Joias musicais de Gilberto Gil são reeditadas

               A Universal Music reabre seu baú de preciosidades. Desta vez, a dona do maior acervo musical do país, traz duas joias do cantor, compositor e violonista Gilberto Passos Gil Moreira, recentemente eleito imortal pela Academia Brasileira de Letras. De 1971, o disco londrino, ‘Gilberto Gil’, reaparece em nova edição em vinil, enquanto ‘Refestança’, registro do histórico encontro de Gil e Rita Lee, de 1977, finalmente ganha versão digital.             Gravado durante o exílio do artista baiano em Londres, o quarto LP de estúdio de Gilberto Gil foi produzido por Ralph Mace para o selo Famous e editado no Brasil pela Philips, atual Universal Music. O produtor inglês também trabalhava com Caetano Veloso, que havia lançado seu primeiro disco de exílio no mesmo ano. Contrastando com a melancolia expressada por Caetano, Gil fez um álbum mais equilibrado, dosando as saudades do Brasil...

50 anos de Claridade

Clara Nunes (1942 – 1983) viu sua carreira deslanchar na década de 1970, quando trocou os boleros e um romantismo acentuado pela cadência bonita do samba, uma mudança idealizada pelo radialista e produtor musical Adelzon Alves. Depois do sucesso do LP ‘Alvorecer’, de 1974, impulsionado pelas faixas ‘Menino deus’ (Mauro Duarte/ Paulo César Pinheiro), ‘Alvorecer’ (Délcio Carvalho/ Ivone Lara) e ‘Conto de areia’ (Romildo/ Toninho Nascimento), a cantora mineira reafirmou sua consagração popular com o álbum ‘Claridade’. Lançado em 1975, este disco vendeu 600 mil cópias, um feito excepcional para um disco de samba, para uma cantora e, sobretudo, para um disco de samba de uma cantora. Traço marcante na trajetória artística e na vida de Clara Nunes, o sincretismo religioso está presente nas faixas ‘O mar serenou’ (Candeia) e ‘A deusa dos orixás’, do pernambucano Romildo e do paraense Toninho Nascimento, os mesmos autores de ‘Conto de areia’. Eles frequentavam o célebre programa no qual Adelzon...

Atrás do Trio Elétrico*

A menos de dois meses do Carnaval, os ensaios técnicos na Marquês de Sapucaí e nas quadras das escolas de samba bombam e os blocos de rua se preparam. Mas existe uma turma de foliões que foge da batucada carioca, preferindo o agito baiano, embalados pelos trios elétricos. “Se você for sozinho vai encontrar muito carioca por lá”, diz o comerciante Roberto Alves, 32 anos, apaixonado pelo Carnaval da Bahia. Para ele, falta a organização na folia do Rio. “Fiquei aqui em 2008 e detestei”, conta o moço que participou de sua primeira micareta (Carnaval fora de época) em 1996, em Belo Horizonte. “Tenho uns cem abadás”, gaba-se Roberto, que já garantiu mais alguns para este ano. Outro carioca, Rodrigo Carvalho, 28 anos, começou a pagar pelos abadás em março do ano passado. “Vou para Salvador há quatro anos seguidos. O clima é ótimo, não é pesado como nas raves”, compara ele, que dividirá um apartamento com 14 amigos durante a folia dos trios. “O mais requisitado é o Me Abraça, o abadá cu...