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Novamente na rua, o samba de Beth Carvalho rende ótimo show


A estreia nacional do show ‘Nosso samba tá na rua’, de Beth Carvalho, na noite de 19 de novembro de 2011, na casa Vivo Rio, no Rio de Janeiro (RJ) foi marcada pela inclusão no roteiro das 15 faixas do CD homônimo lançado este mês pelo selo da artista, ‘Andança’, distribuído pela gravadora EMI Music. Fato incomum no show business contemporâneo, onde muitos cantores recorrem ao passado de glórias para conquistar um preguiçoso público, a corajosa – e sábia – opção de Beth deve ser louvada. Após dois anos afastada dos palcos por problemas de saúde, a “madrinha” poderia simplesmente cair na tentação de enfileirar antigos sucessos em sua volta ao disco, mas felizmente mostrou que continua a ser antena do ritmo celebrado como raiz.
O repertório apresentado confirmou a expertise de cantora em valorizar novos nomes do samba, como Leandro Fregonesi e Rafael dos Santos (‘Chega’), sem esquecer os bambas consagrados como Nelson Cavaquinho (1911 – 1986) e Guilherme de Brito (1922 – 2006) (‘Palavras malditas’, 1957).
Nascente de um novo samba onde a cantora foi beber no final dos anos 1970 quando lançou o emblemático disco ‘Beth Carvalho na fonte’ (1978), a turma de compositores do bloco carnavalesco Cacique de Ramos esteve muito bem representada por Zeca Pagodinho. Beth relembrou ‘Camarão que dorme a onde leva’ (Beto Sem Braço/ Zeca Pagodinho/ Arlindo Cruz), que marcou a estreia fonográfica do afilhado na faixa do disco ‘Suor no rosto’ (1983). A dupla ainda levou o sucesso ‘Deixa a vida me levar’ (Serginho Meriti/ Eri do Cais) na base do improviso, explicitando a felicidade daquele momento.
A reverência que o mundo do samba presta à cantora pode ser entendida quando Beth faz questão de anunciar cada autor das canções do espetáculo, valorizando bambas novos e antigos na mesma proporção. Entre um samba dos emergentes Ciraninho, Rafael dos Santos e Leandro Fregonesi (‘Samba mestiço’) e a encomenda da novela das 21h feita pelo trio de ouro Arlindo Cruz, Zeca Pagodinho e Sombrinha (‘Guaracy’), Beth reverencia Dona Ivone Lara, “que faz o laraiá mais bonito da música popular brasileira”, a quem o novo trabalho é dedicado. Comprovando mais uma vez sua habilidade em garimpar preciosidades, a cantora foi buscar na dolente obra de Dona Ivone um samba pra lá de bonito chamado ‘Em cada canto uma esperança’, parceria da dama do Império Serrano com Délcio Carvalho.
Também merecem destaque ‘Arrasta a sandália’, insuspeitado samba assinado pela filha da cantora, Luana Carvalho e por Dayse do Banjo, e ‘Tambor’ (Almir Guineto/ Adalto Magalha/ Daniel Oliveira).
No bloco dedicado à mistura que deu origem ao povo brasileiro e ao gênero musical mais identificado com o país, Beth relembra ‘Coisa de pele’ (Jorge Aragão/ Acyr Marques) e canta o vigoroso ‘Samba mestiço’ e o afirmativo ‘Negro sim sinhô’ (Marquinho PQD/ Efson/ Franco), ressaltando a ótima costura do roteiro.
Próximo ao final do espetáculo, ela recorda ‘Caciqueando’ (Noca da Portela), ‘Vou festejar’ (Jorge Aragão/ Dida/ Neoci) e volta para o bis consagrador com as clássicas ‘As rosas não falam’ (Cartola) e ‘Coisinha do pai’ (Jorge Aragão/ Almir Guineto/ Luiz Carlos), além de ‘Água de chuva no mar’ (Carlos Caetano, Wanderley Monteiro e Gerson Gomes) inspirado samba romântico lançado por ela em 2000, no CD ‘Pagode de mesa 2 – ao vivo’ (Indie Records). Olhando para o presente (e para o futuro), sem esquecer o passado, Beth Carvalho reafirma a excelência que faz dela a madrinha do samba.

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