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O samba romântico e alto astral de Leandro Sapucahy

“Malandro também ama” (EMI Music), avisa Leandro Sapucahy em seu terceiro disco como intérprete. Produtor tarimbado, responsável pelos bem-sucedidos álbuns de Arlindo Cruz (‘Sambista perfeito’, em 2007), Maria Rita (‘Samba meu’, em 2007) e Marcelo D2 (‘Canta Bezerra da Silva, no ano passado), Sapucahy coloca seu canto macio a serviço de um samba mais romântico, acertando quase sempre.
‘A que mais deixa saudade’ (Serginho Meriti), gravada por Alcione no CD ‘Faz uma loucura por mim’ (2004), abre os trabalhos de forma dolente. Compositor de seis faixas do disco, Meriti é autor do sucesso ‘Deixa a vida me levar’, gravado por Zeca Pagodinho, além de frequentar os mais recentes álbuns da citada Marrom. A bonita ‘Agradecendo a Deus (Vala comum)’ (Serginho Meriti/ Serginho Madureira/ Capri) inventaria os caminhos percorridos pelo sambista e valoriza suas escolhas em clima pra cima, longe de qualquer baixo-astral.
Carioca nascido em Jacarepaguá, Leandro manda bem em ‘Não quero mais saber de nada’ (Serginho Meriti/ Mariozinho Lago), samba cheio do balanço também presente no ótimo ‘Depois daquele adeus’ (Serginho Meriti/ Claudinho Guimarães): as separações nem sempre precisam ser tristes.
O refrão da boa ‘Disse me disse (É cão)’ (Serginho Meriti/ Claudinho Guimarães) remete a ‘Salve São Sebastião’ (Sombra, Moisés Santiago/ Carlos Caetano), samba que abre ‘Carioca da gema’, álbum gravado por Beth Carvalho em 1996.
‘Ê, coração’ (Serginho Meriti/ Bruno Meriti/ Rodrigo Leite), faixa escolhida para tocar nas rádios, é mais uma faixa alto astral. O que não acontece em ‘Militante do amor’ (Leandro Fab/ André Renato) que tem a bonita melodia prejudicada pelos clichês de versos como “Quem nunca sofreu pra ser feliz?” ou “Não vou remar contra a maré”.
Sem o cunho social que pautou ‘Favela Brasil’, primeiro DVD de Leandro Sapucahy lançado em 2008, a “comunidade” está de volta com mais leveza em ‘Favela fashion week’ (Nego Branco/ Cleitinho Persona/ Manu), crônica bem humorada do vai-e-vem das vaidosas moradoras do lugar. ‘Lados paralelos’ (Flavinho Silva/ Carlinhos da Ceasa/ Almir de Araújo) expõe os dilemas do fogo cruzado do amor: “Meu lado bandido me diz que estou enganado/ Meu lado mocinho, completamente apaixonado”, entrega o cantor em tempos de UPP.
‘Tá mal na moldura’ (Xande de Pilares/ Leandro Fab/ Ronaldo Barcellos) é daqueles sambas característicos do Grupo Revelação que injeta suingue na faixa, em participação não creditada. O vocalista Xande de Pilares assina, ainda, as fracas ‘Nosso amor é perfeito (com Claudemir/ Gilson Bernini) e ‘Trilha sem fim’ (com André Renato/ Gilson Bernini).
Além de produzir ‘Malandro também ama’, Sapucahy tocou vários instrumentos em quase todas as faixas desse disco, que servirá de base para o segundo registro áudio visual do sambista, quem sabe ainda este ano. O cantor tem que dividir o tempo com o disputado produtor: após finalizar o próximo disco de Arlindo, Leandro está produzindo Reinaldo, o príncipe do pagode, e ainda virão os álbuns de Diogo Nogueira e Renato Milagres, sobrinho de Zeca Pagodinho – a quem Sapucahy dedica ‘Malandro também ama’.
Um dos nomes do bloco carnavalesco Sapucapeto, sociedade com a estilista Isabela Capeto, integrante fixo do ‘Esquenta’, programa comandado por Regina Casé que tem a segunda temporada garantida, Leandro viu seu álbum dedicado à obra de Roberto Ribeiro (1940 – 1996) ser ignorado pelas rádios. A escolha por um trabalho mais romântico restituiu seu (bom) samba às programações das emissoras populares. Malandragem de quem não fica “marcando touca, parado/ De braço cruzado”.

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