Fundadora do Sururu na Roda, um dos grupos de samba que agitam a noite da Lapa, Nilze Carvalho acaba de lançar pela gravadora Biscoito Fino ‘O que é meu’, seu segundo disco solo como cantora. Com produção da própria Nilze e de Edu Krieger, o álbum alinha ritmos variados como xote, maracatu, samba de roda, ijexá e marcha-rancho, mostrando que a virtuose do cavaquinho e do bandolim também domina bem o canto.
O timbre interessante compensa a pouca extensão da voz segura e sempre bem colocada fazendo com Nilze se destaque entre as colegas de profissão surgidas no boêmio bairro carioca revitalizado lá se vai uma década. O que já era notado em ‘Estava faltando você’, disco lançado em 2005.
Seis anos depois, a cantora se mostra ainda mais à vontade e acerta em vários momentos como na faixa-título, samba de roda composto pela dupla Toninho Geraes e Toninho Nascimento, e na gravação de ‘Banho de manjericão’ (João Nogueira/ Paulo César Pinheiro), clássico da discografia de Clara Nunes.
Sua suavidade, porém, não se adequa aos versos fortes de ‘Festa’, maracatu de Gonzaguinha gravado por Maria Bethânia. É impossível não se lembrar da vigorosa interpretação da diva baiana no show ‘Maricotinha’ (2004). Nilze se sai melhor na bela e pouco conhecida ‘Doces recordações’ (Ivone Lara/ Délcio Carvalho) e em ‘Lua Cheia’, bissexta parceria de Toquinho e Chico Buarque.
Polivalente, ela também fez os arranjos de algumas faixas, obtendo resultados díspares. Com interessante citação de ‘Retirantes’ (Dorival Caymmi/ Jorge Amado’) o clássico ‘Lamento da lavadeira’ (Monsueto Menezes/ João Vieira Filho/ Nilo Chagas) é diluído pelo arranjo salseiro. Nilze se redime em ‘Barracão’ (Luiz Antônio/ Oldemar Magalhães) que conduz para o choro através de seu belo bandolim.
De sua própria lavra destacam-se ‘Proposta de paz’ (Nilze Carvalho/ Cristino Ricardo) e o xote ‘Nordestino’ (Nilze Carvalho/ Zeca Leal). Já a fraca ‘Ela sabe quem é’ (Nilze Carvalho/ Camila Costa) cita mulheres da cultura brasileira em versos opacos. Nada que comprometa a qualidade do trabalho.
Com sua voz delicada, que por vezes se aproxima do registro de Fátima Guedes, Nilze Carvalho pode evoluir mais se imprimir maior personalidade em seu canto. Talvez (se conseguir) gravar um álbum como intérprete, deixando os instrumentos de lado, se concentrando apenas na voz.
Às gravadoras que lamentam a ausência de uma grande cantora de samba, eis aí Nilze Carvalho. Só desconhece quem é ruim da cabeça ou doente do pé.
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